13 de janeiro de 2010

Dia de janeiro na rotina da menina

Escrever uma música.
Ela não costumava seguir instruções de diários tolos, mas era uma boa coisa há se fazer, aquela indicação do dia. Não machucaria ninguém e talvez ela precisasse mesmo desabafar de alguma forma.
O céu continua chorando
desde ontem
(chora e pára)
...
E eu continuo sorrindo
E querendo viver,
tentando tornar isso realidade
Eu assisto à chuva cair
Ela chegou tão rápido
E sinto o vento gelado bater em minha pele
Só depois vi que a chuva era ácida
e que estragou a beleza das rosas
E o vento...?
É estranho ver cair a chuva
olhar para cima e ver o céu azul
Não há sol
A verdade é que
O céu depois da tempestade é o mais bonito
E a noite, a mais estrelada,
mesmo que ainda con...
- O que você está escrevendo?...
Interrompida, mais um vez. Nem para escrever em paz num caderno velho ela tinha paz! Privacidade não era, enfim, algo com o que ela podia conviver. Talvez fosse apenas uma definição abstrata e longínqua, pois quando não era sua irmã entrando no quarto ou sua mãe perguntado com o pescoço espichado "O que você está fazendo, querida?", era seu pai chamando para ajudar na loja, e nesse caso, era trabalho até o meio da noite.
Mas o pior, o pior mesmo, era saber que enquanto dormia sua mãe bisbilhotava suas coisas, procurando qualquer indício de alguma coisa que provavelmente ela fantasiava em sua mente. Papéis, cadernos, blocos... A menina gostava de escrever porque não tinha com quem falar. Porém, mal podia escrever pois sabia que seria invadida, violada, folheada em seu interior, expondo seus segredos e temores. Paixões também.
Foi como aquele dia em que a aula acabou mais cedo e ela foi dar uma volta com a amiga. Quando chegou em casa, a mãe parecia uma louca, irritante sem saber do paradeiro da filha. "Liguei, liguei para o celular da fulana, mas ela não atende. Por que não atende? Nunca atende! E você menina, sai de casa e deixa o seu aqui!... Não faz mais isso, não faz! Como vou saber onde você está?" Indignada, ambas. A garota por um motivo justo. Nesse dia ela descobriu que a mãe dela ligava para escola várias vezes para saber se a filha ainda estava em sala de aula.
Então era isso? Ela era uma criminosa, que precisava ser vigiada durante todas as horas do dia? Ela ia fugir de casa no meio da tarde? Ela era de ouro? Talvez fosse, mas com valores que sua mãe não sabia apreciar. E talvez, mais ao fundo, ela quisesse ser todas essas coisas, criminosa, fugitiva, rebelde... Qualquer coisa que conferisse mais emoção à sua vida e a fizesse ousar mais porque aquela vida de resignição a estava sufocando.
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Do diário da amiga ("fulana")
Às vezes é só dobrar o problema ao meio e a solução aparece
Com tantas pessoas no mundo
será que tem alguém
fazendo a mesma loucura que você?
Será que tem alguém olhando pelo mesmo jeito...?
É azul e preto,
fosco e tremido
E a lembrança do que possa significar é fraca
Mas ainda espero que um dia me lembre.