Escuto a música vindo baixinho do meu quarto. Contida. Assim
estou. Essa mesma música é retrato de janeiro ensolarado e quente, tempos de
recuperação e fantasias. Logo em seguida fevereiro, com seus ares agitados,
rotina pesada que chega. Março com águas que levaram minha alegria, lavaram
meus olhos e um pedaço dessa triste realidade ficou exposta e crua para mim.
Desde então não sou mais a mesma. Preferia não ter recebido esse “presente”, eu
acho. Abril passou mudo e maio já está se dirigindo para a porta de saída. Mas
antes que isso aconteça e mais uma página do calendário vá para o lixo, gostaria
de dizer que nem sempre foi assim.
Nos últimos dias, uma inquietude se apossou de mim. A
vontade de ler Desculpa se te chamo de
amor é tamanha que vejo toda a poesia e romance do livro em qualquer coisa
que olho. Todos falam, todos percebem, e mesmo assim isso não me traz o que
mais anseio. Penso que esse desejo repentino pelo livro tenha explicações que
vão além do simples fato de eu ter gostado da leitura (como boa psicóloga tenho
que procurar razões para as coisas, claro). Foi abril, do jeito que o céu
estava azul era abril mesmo. Porque é assim que tenho esse mês na memória:
azul. E todo o romance e surpresas do livro, e a simultaneidade também. Como o
mar que se agita e depois se acalma, lembro-me de ficar chateada com alguns
momentos do livro em que a estabilidade era tanta que chegava a ficar chato, e
parecia que nunca ia mudar. Coitada de mim, à época nem percebia que isso
também faz parte de uma relação, de um amor, e esse é o verdadeiro sentido do farol:
o sentimento também guia nesses momentos cotidianos e naqueles em que parece
que não há saída também. Mas eu só conseguia ver intertextualidade com a minha
vida, e sonhar, e ligar os pontos de um desenho sem forma para os outros, com
sentido só para mim.
E a verdade é que adentrei maio lendo esse livro, ele me
acompanhou pelo o que pareceu uma eternidade naquele mês em que o frio chegava
enquanto as paredes eram pintadas de amarelo e a janela de azul. Aquela reforma
foi divertida como todas as outras quando eu era criança. Ah, como sinto falta
da minha casa, e daquelas páginas, e das tardes de sol, e soneca, e ansiedade
pela festa, e noites sem fim à luz da tela. Eu era tão feliz sonhando, chamando
de amor, sem pedir desculpas.
E a verdade é bem essa da leitura do livro: abril e maio
sempre me pareceram um, distintos de alguma forma, mas nas lembranças cheios de
momentos que se intercalam. Grandes intervalos de tempo em que reina um céu de azul
muito intenso e sol morno, quase um abraço. É quando as neblinas começam
anunciando dias deslumbrantes. Naquele ano, esses meses ficaram marcados para
mim, definiram-se como o que sempre foram... E agora, quando tudo parece tão
apático, queria resgatar esses dias de cor. Mas parece que ainda estão muito
presos na memória...