18 de novembro de 2010

Toque o seu limite

Esta noite as lágrimas se misturaram as gotas de chuva. Assistí Senna, o filme. Não me lembro de alguma vez ter me emocionado tanto assistindo a um filme...
Me sentí transportado para a minha infancia, acho que até meu coração batia de forma diferente. A voz de Ayrton se misturava ao cheiro de café e a voz do meu pai, tudo isso me acompanhava nas manhãs de sábados e domingos quando eu tinha apenas 5, 6 anos de idade. Lembro perfeitamente! Era meu passatempo favorito. Passava as semanas aguardando os fins de semana, brincando com meus carrinhos, projetando as corridas, andando pela casa com o capacete velho dos tempos de motociclista do meu pai. Senna era o meu carrinho branco e vermelho, que largava em ultimo e chegava em primeiro em todas as corridas. Suas fotos, as cores do Brasil, os S pintados com lapis de cor nas paredes do quarto...
Durante o filme eu me lembrava de mais e mais coisas, me emocionava em cada passagem, cada entrevista, cada depoimento e cada trecho de corrida.
Falando sobre o filme, acredito que não seja nenhuma obra prima do cinema, nem o maior acervo de imagens do Senna. Mas a abordagem do documentário não se resume ao Herói brasileiro, ou ao melhor piloto da história. Senna é um filme sobre a VIDA.

Ayrton nunca se importou em ser campeão, bi, ou tri-campeão mundial... Ele corria porque amava o que fazia. Tinha total noção dos riscos que corria, sabia que representava um país inteiro, sabia pilotar. Apesar disso, o motivo pelo qual pilotava de forma fantástica era a superação de seus limites. Como ele mesmo costumava dizer:
"O ser humano possui limites, quando voce toca esse limite, quando voce vive esse limite, voce é capaz de realizar absolutamente qualquer coisa."
Todos que o viram correr, sabiam que ele estava em paz quando estava alí dentro do carro e não precisava de dinheiro ou fama para continuar a fazer aquilo. Senna enfrentou muitas dificuldades e superou mais e mais limites.
Nada o teria feito parar. Ele simplesmente não podia. Pilotar era a sua vida e ele deixaria de viver quando deixasse de pilotar.
  
Quando Senna morreu em Maio de 94, uma parte de mim morreu junto com ele. Minhas notas cairam, meu interesse por brincadeiras com outros colegas, a temporada de fórmula 1, meu carrinho vermelho e branco... Eu não conseguia entender... Para mim, e não só para mim, Senna era imortal. 
Algumas conversas e uns novos passatempos me fizeram acostumar com a idéia de que o mundo continuaria a existir, com ou sem Senna.
Só pude compreender a complexidade de algumas frases do meu pai depois de todos esses anos. Ele me disse no dia que me contou que Senna não correria mais nenhum GP.
"Filho, quando alguém faz o que gosta com o máximo de dedicação e o máximo de energia naquele único propósito, ele se torna próximo da perfeição. Senna fazia o que fazia, porque tinha momentos de perfeição. Nesses momentos, ele conseguia sentir Deus a sua volta e dentro dele. Chegou a hora em que ele precisa estar mais próximo de Deus, para ser ainda mais perfeito."

Após essa frase, meu pai terminou:
"Existe um meio de voce encontrar Senna novamente. Encontre algo que te faça feliz e dedique-se a isso o máximo que voce conseguir. Entregue-se. Enfrente o que for necessário, atinja a perfeição. Nesse momento, vai encontrar com ele e Deus. Acredito até que sejam amigos..."

Ainda escuto os gritos de Senna e do meu pai juntos no GP Brasil de 91 quando fecho os olhos. Meus filhos vão escutar também. Meus netos. Sempre saberão que existiu um herói, um piloto e um ser humano que em certos momentos da vida atingiu a perfeição.