9 de julho de 2011

Lar, doce lar...

"Nada como estar em casa (...)", eu disse. Eu sei que não é saudável ler esse post passado agora. Não agora que a casa foi vendida. Ainda agora, há alguns minutos. Chamaram-me para ser uma das testemunhas. Não havia mais ninguém para ser. Nessas horas não dá para ser criança, bater o pé, dizer que não quero, rasgar os papéis. Eu concordei no começo com a história toda, agora é para ficar de cabeça erguida, mesmo que o arrependimento bata no último momento, não é? Então é isso. Esta casa não é mais a minha casa.
Quando todos partiram, vi-me no mesmo canto de anos atrás, à direita da porta de entrada, olhando a grama, o céu, o nada. Foi onde eu fiquei quando criança, minha avó prestes a vender a casa e eu não queria. Para o meu mundinho colorido aquilo era uma coisa inaceitável, "esta é minha casa, vó, nossa casa!". E a oportunidade que todos diziam ser boa, foi-se embora. Aqui ficamos, aqui cresci, aqui criei histórias, e outras coisas, o taco da sala transformando-se em reinos e estradas, montanhas e cachoeiras. Aqui brincávamos os primos, comíamos espigas de milho, corríamos pelo jardim. Passamos natais, a Lila veio; aqui, corri com ela para todos os lados, já a tranquei dentro do armário, coloquei-a em cima do sofá. Aqui li livros e livros, varei noites estudando. Aqui caí muitas vezes e me machuquei, arranquei meus dentes de leite, gritei de pavor das baratas. Olhei o horizonte à toa, à toa, devaneando, pensando minha vida, fantasiando-a, nutrindo sonhos de ir pra bem longe, atravessar oceanos. (E eis que atravesso alguns quilômetros e fico louca pra voltar!) Aqui minha vó adoeceu, na sala de casa passamos tardes e tardes conversando com a Dona Jô, aqui, meu castelo, meu refúgio, desde criança, desde adolescente, desde agora (o que eu sou agora?), desde sempre. E de algum modo, sempre será, mas daqui para frente, apenas em intenção. 
Quando criança, eu me imaginava "crescida", vindo visitar a rua que um dia morei. Como estaria minha casa? Provavelmente muito velha. Eu não queria vê-la velha, destruída. Então pensava como seria interessante se houvesse aqui apenas uma grande árvore. Mas podia haver provavelmente um prédio, do jeito que as cidades crescem... Eu preferia a ideia da árvore, ela não impede a vista do sol nascendo pelos fundos. Mas a verdade, é que agora não sou mais criança e sei que algumas coisas não são tão fáceis quanto parecem e percebi, por mais difícil que tenha sido, que sonhar e imaginar não vai resolver meus problemas.
Não acho que minhas lembranças e tudo o que foi vivido aqui, tudo o que traz a marca de "lar" para esta casa, não acho que isso valha X mil. E se eu já acho que vivi muito aqui, minha mãe e minhas tias então...
O medo bate no meu coração, a incerteza do futuro. Vai dar tempo de arranjar um bom lugar? Haverá dinheiro o suficiente? Para onde vamos agora? Minha mãe quer tanto começar de novo em outra cidade, mas temos nos decepcionado por onde já andamos procurando... E se for aqui, existe lugar melhor do que o lar que um dia foi nosso?? Dizem para mim que vai dar tudo certo. Eu tento ficar calma. Mas a sensação de que sou um pouco intrusa aqui toma uma parte pequena de mim. Queria poder amarrar todas as minhas lembranças e mais um pouco de confiança e levar com a gente, onde quer que a gente vá... Eu só quero conseguir ver o sol nascendo ao fundo, ter apoio, mas também apoiar. Ajudar a construir um novo lar, já que é isso que deve ser feito, e fazer isso feliz.